Universidade de São Paulo (USP). (Foto: George Campos/Jornal da USP)
Universidade de São Paulo (USP). (Foto: George Campos/Jornal da USP)


A Universidade de São Paulo (USP) recebeu, na última terça-feira (6), o prazo de 72 horas para restabelecer a matrícula do estudante Glauco Dalalio do Livramento, de 17 anos, na Faculdade de Direito. Ele fora aprovado em primeira chamada pelo Provão Paulista, mas não foi considerado pardo pela Comissão de Heteroidentificação da USP. A rejeição o fez perder a matrícula.

Nesta semana, o juiz Radolfo Ferraz de Campos, da 14ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo concedeu liminar determinando o restabelecimento da matrícula na instituição no prazo de três dias. O magistrado entendeu que a avaliação feita pela comissão “ofendeu a isonomia”, pois foi realizada por meio de fotografia e de conversa com o candidato por videochamada pela internet.

Glauco Dalalio do Livramento mora em Bauru, distante cerca de 330 quilômetros da capital paulista, e concorreu a uma vaga para estudantes egressos do ensino público e autodeclarados PPIs – pretos, pardos e indígenas. No ato da inscrição, ele se declarou pardo.

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O relatório da Comissão de Heteroidentificação, feito com base na avaliação fotográfica e na entrevista pela internet, o apontou como um candidato de “pele clara, boca e lábios afilados, cabelos lisos, não apresentando o conjunto de características de pessoa negra”.

“Ao que parece, não se querendo aqui pura e singelamente substituir as bancas julgadoras administrativas (a de origem, que decidiu por maioria, e a recursal, à unanimidade), não se pode mesmo olvidar que o autor é simplesmente filho de pessoa de raça negra, e eventualmente imagens que ora o favoreçam, ora não, na conclusão de pertencimento à raça negra, seja preta ou parda, não parece aqui ser um critério razoável em contexto como este, quanto menos para aferição à distância”, diz parte do despacho do juiz.

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Na semana passada, a defesa do estudante acionou a Justiça ao alegar que a avaliação de heteroidentificação dos candidatos não seguia critérios iguais, uma vez que os egressos do vestibular próprio da USP eram avaliados de forma presencial, enquanto os oriundos de outros vestibulares, como foi o caso de Glauco, passariam pelo processo de avaliação de forma remota. A reitoria da universidade estuda agora modificar o sistema de avaliação de cotistas estendendo o modelo presencial a todos os candidatos.

Glauco do Livramento, de 17 anos, é de Bauru e foi aprovado na 1ª chamada do Provão Paulista. (Foto: Arquivo pessoal)
Glauco do Livramento, de 17 anos, é de Bauru e foi aprovado na 1ª chamada do Provão Paulista. (Foto: Arquivo pessoal)

“Há, pois, prova indicativa da probabilidade do direito alegado. O perigo da demora é inerente à própria exclusão do curso universitário para a qual, inclusive, já tinha se pré-matriculado, dada a sequência que terá, o que poderá implicar prejuízo irreversível”, concluiu o juiz.

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Em nota, a Universidade de São Paulo diz que cumprirá “quaisquer ordens judiciais e que apresentará em juízo “todas as informações que explicam e fundamentam o procedimento de heteroidentificação”.

Também na USP, mas no curso de medicina, Alison dos Santos Rodrigues, de 18 anos, autodeclarado pardo e que obteve classificação pelo Provão Paulista, teve a matrícula cancelada após a Comissão de Heteroidentificação concluir que ele não é pardo.

Alison Rodrigues, de 18 anos, é de Cerqueira César e também foi aprovado via Provão Paulista. (Foto: Arquivo pessoal)
Alison Rodrigues, de 18 anos, é de Cerqueira César e também foi aprovado via Provão Paulista. (Foto: Arquivo pessoal)

A 2ª Vara Cível do município de Cerqueira César, interior paulista, onde Alison reside, deu prazo de cinco dias para a USP explicar a razão de ter rejeitado a autodeclaração, o que o levou a perder a vaga no curso.

Em nota, a defesa do jovem afirmou que “o que se extrai dos fatos é que os parâmetros utilizados pela Comissão de Heteroidentificação são absolutamente subjetivos, sem critérios adequados para serem aferidos. Por isso, permitir que a USP apresente a motivação da decisão que negou provimento ao recurso administrativo apresentado pelo candidato, é permitir que ela se beneficie da proporia torpeza, uma vez que a instituição teve a oportunidade de justificar os motivos da sua decisão quando enviou o e-mail da negativa, e não o fez”.

A Justiça determinou ainda multa diária de R$ 500, limitada a R$ 20 mil, caso a ordem seja descumprida pela instituição de ensino.