Imagem ilustrativa. (Foto: Pixabay)
Imagem ilustrativa. (Foto: Pixabay)


Por Henrique Lucarelli

Começamos com um pensamento emprestado. Resumidamente, no livro “A República”, de Platão, há a descrição de uma cidade perfeita. Uma das importantes qualidades desse local, segundo o autor, seria que ninguém ocuparia uma função contra os seus talentos.

Mas como isso se daria? Lá, haveria uma educação pública com o objetivo de entender para onde as habilidades de cada um apontavam e, tão cedo isso fosse percebido, para aquela determinada função a pessoa era enviada.

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Para ficar claro, um exemplo: notou-se que Moacir* tem uma aptidão para o prático, noção básica das operações matemáticas, adora ficar satisfeito e negocia com a razão acima de tudo. Qual o lugar dele? Ele deve ser um comerciante, para ajudar a prosperidade da cidade perfeita, pois ela precisa comercializar com os vizinhos, vendendo o que sobra e comprando o que falta. É a pessoa aplicando ao máximo suas qualidades para o bem coletivo. Afinal, quem desejaria um comerciante com tendências a ser perdulário ou ruim na negociação?

Com isso em mente, convido o leitor a uma reflexão. Outro dia, em uma aula, um jovem aluno me disse: “Professor, estou estudando para passar em Medicina.” Respondi: “Quem bom! Mas não sabia que você queria ser médico…” E ele me respondeu: “Não, professor, eu quero ser famoso; mas antes preciso ter dinheiro.”

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Há muitas verdades colocadas por de trás desse diálogo, mas uma, em especial, gostaria de destacar. O descolamento completo da identidade e da profissão; o desejo do aluno é ser famoso, e a medicina é somente um caminho. Ele – na verdade – não deseja “ser médico”; deseja a fama. Fica a questão: será ele no futuro um médico feliz?

Termino hoje com uma provocação dentro de minha área de atuação: a educação. Ser professor, como identidade profissional, tem se tornado cada vez mais raro. O resultado disso é prático: os jovens com talento para a docência não procuram mais essa carreira – em vista dos maus salários e do pouco prestígio –, os demais se aventuram, mas entendem a profissão somente como um meio. O resultado é cruel: gente frustrada ensinando gente a ficar frustrada.

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Henrique Lucarelli é professor e mestre em História pela Unicamp.




*Os personagens são integrantes de uma crônica ficcional

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do site.